A mulher está ao Nextell e o volume da coisa é tal que vence o barulho do trânsito para quem passa tomar ciência da conversa.
Somos informados que uma colega de trabalho de ambas quer ganhar sem trabalhar, tem histórico de roubo na tesouraria e persegue as duas no escritório. É mais um capítulo do inferno astral da interlocutora, que anuncia à amiga de Nextell: “meu marido ficou brocha”.
Fosse há vinte anos e talvez não merecêssemos ouvir tal inconveniência – não a do diálogo de fofoca, mas a de sua democrática exposição.
Nos anos 80, anos de meus 20 anos, talvez não fosse maior o recato entre amigas. É provável, no entanto, que a confidência ficasse restrita ao círculo da amizade de fé.
O fato é que a exposição da própria intimidade não pode ser analisada como pouco tempo atrás o foi, como uma anomalia do espetáculo a intrometer-se em nosso cotidiano.
Ela já parece habitar a paisagem interna do brasileiro médio. É realidade que não mais nos estranha.
Queime-se o moralista que condena o reality show do momento. A tranquilidade na própria exposição mostra uma mudança de conduta pública que não me parece acidental e passageira.
Big Brother Brasil aumentou sua premiação para R$ 10 milhões. A Nextell, por sua vez, comemora os 700 mil novos usuários desde 2005 – a maioria no mercado corporativo – de seu telefone com tecnologia push-to-talk (PTT, ligação direta via rádio).
A exposição da intimidade deixou de ser variável cultural para ter viabilidade comercial.
Quem sabe virou componente de civilização.
segunda-feira, 13 de julho de 2009
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Uma análise dos nossos tempos bastante oportuna e que põe por terra a ideia do "grande irmão" como manipulador e observador da multidão e coloca em xeque a ideia de que também gostamos de revelar nossa intimidade banal e corriqueira. É o mercado que cria as necessidades ou o mercado as identifica na sociedade de consumo?
ResponderExcluirBelo texto, Luiz. Parabéns!