segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

A anti-retórica de Operação Valquíria

O filme Operação Valquíria pode até revitalizar a carreira de Tom Cruise, mesmo sendo o enézimo filme-história-viva contra o nazismo. A tensão é tal que o ar é fatiável como bisnaga, e é assim que o filme contorna, com consistência, a armadilha da previsibilidade. Previsível porque seu desfecho é manjado: o frustrado atentado a bomba contra Hitler realizado por uma nata de oficiais de seu regime. Consistente porque faz os personagens respirarem em cena e mesmo o mais despudorado oportunismo de alguns dos conspiradores é velado, cheio de hiatos, contido.

O impressionante de fato, a meu ver, é a quase total falta de esforço retórico dos líderes do complô para conquistar conspiradores.

Os candidatos a assassinos de Hitler gastam muito pouca saliva para engrossar suas fileiras. A não ser que a resistência interna fosse um desejo escancarado e tratado com permissividade, coisa que o próprio filme descarta. Há um pisar de ovos no filme, um dito que não pode ser dito e tudo é editado de forma a que se economizem palavras de convencimento. É sua maior qualidade técnica de roteiro, aliás. Por isso, a facilidade por vezes instantânea de conquistar seguidores parece um calo ósseo no filme. É de deixar muita gente saudosa de outro tipo de registro, em que a força da retórica, mesmo manipulativa, faz toda a diferença. Até para os ouvidos do nazista caricato de plantão.

Lembro de Oskar Schindler (Liam Neeson) ao lado do SS Amon Goeth (Ralph Fiennes), sádico comandante do campo de concentração de A Lista de Schindler (1993), de Steven Spielberg. O filme tem aqueles excessos spielberguianos, que não é o caso retomar, mas uma cena antológica para os estudos retóricos, que comentei ontem.

2 comentários:

  1. Salve, Luiz!
    Parabéns pelo texto, sempre em nome da língua!

    Gabriel Perissé

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  2. Belos textos, Luiz. O contraponto entre o dito e o não dito " enquadrou " perfeitamente o poder da retórica.
    "Não se apanham moscas com vinagre, apanham-se com mel" , em ambos os textos você apresentou amargo mel retórico do regime nazista.
    Abraços,
    João Jonas

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